Era para o PSDB ter feito o que cobrou do PT no passado, diz Gustavo Franco
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O ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, que deixou o PSDB há um mês, diz que ele e outros economistas ligados aos tucanos estavam desgostosos com a sigla havia um tempo. O partido tinha adotado um "discurso ambíguo" em relação à defesa da economia de mercado.
O cenário piorou neste ano, quando o PSDB não soube lidar com dilemas éticos. Preservou o senador Aécio Neves na presidência, enquanto é alvo de acusações, e se manteve na base aliada do governo de Michel Temer.
A agenda de reformista do presidente não justificaria tal apoio irrestrito, segundo ele.
"Não vejo no governo Temer a mesma ética que gostaria de ver praticada", diz Franco, um dos formuladores do Plano Real e que se filiou ao Partido Novo.
Pergunta - O sr. escreveu uma carta a para explicar a desfiliação, mas é impossível não perguntar: por que deixou o PSDB?
Gustavo Franco - As razões estavam todas ali, bem explicadas. No detalhe, há uma questão antiga de como o partido de denominação social-democrata se torna mais contemporâneo.
O que seria isso?
Mais em sintonia com os temas de uma economia de mercado que o Brasil precisa se tornar. O PSDB sempre praticou isso quando foi governo federal, embora tivesse um certo incômodo com essa prática e um discurso um tanto ambíguo. É uma questão antiga.
Ficou mais desconfortável depois da Presidência do Fernando Henrique, quando sucessores dele no partido, os candidatos [José] Serra [senador], Geraldo [Alckmin, governador de SP] e mesmo o Aécio, não tinham a mesma capacidade que Fernando Henrique de, vamos dizer, ter uma prática diferente da herança social-democrática da geração 1988, que marcava muito a origem do PSDB.
Isso criava desconforto para mim e muitos outros economistas do partido, mas era muito mais teórico do que real, sobretudo se o partido está fora do governo. Mas depois apareceu a questão específica do Aécio e sobre como o partido deveria se comportar diante de uma dúvida ética.
A questão do Aécio pesou?
Sim. Como gesto político, podia ter se afastado para montar a sua defesa. Mas ficar presidente do partido com todas essas dúvidas, para dizer o mínimo, é difícil. Aí houve uma questão imediata: era para fazer o que, no passado, cobramos do PT.
O sr. falou com Aécio depois?
Não o encontrei e não falei com ele. Eu e outros no partido também não estávamos satisfeitos com o apoio irrestrito do PSDB a Temer. Preferíamos que o partido assumisse uma posição de independência: apoiasse as agendas econômicas, itens que o PSDB tinha sintonia, mas o resto, não.
Por que não ficar na base de apoio se a agenda é igual?
E por que não permanecer independente e apoiar apenas as agendas econômicas? Não sei se as agendas políticas fazem sentido. Minha posição é que não. Mas eu sou apenas um professor universitário. Como filiado de muitos anos, mandei minha carta, com meus pensamentos. Não aconteceu nada. Procurei outro partido, onde estou muito confortável e muito feliz.
Qual o problema da agenda política do governo?
Há um assunto central para mim e para o Novo que é o da ética na política, que tem na Lava Jato um de seus mais importantes impulsos. Não vejo no governo Temer a ética que gostaria de ver praticada.
Qual, então, é a sua avaliação para o fato de Temer ter saído ileso nas duas denúncia?
Tudo é lamentável nesses episódios, dos quais todos os envolvidos saíram menores.
Por que o Partido Novo?
Para começar, porque ele está numa posição privilegiada no processo de renovação político-partidário.
Dois, porque tem a mais a cara de uma organização da sociedade civil, como tantas que estão arregimentando gente desiludida com a política tradicional.
Três, porque sua tática é fazer diferente do que fazem os partidos tradicionais, inclusive na coisa mais importante para muitos deles que é o fundo partidário.
Quatro, porque, do ângulo doutrinário, tem muita afinidade com o que eu penso: que a economia de mercado é um princípio organizador básico da política econômica e da economia brasileira. São quatro boas razões.
O que seria "posição privilegiada"?'
É uma posição de destaque na renovação política. O quadro de filiados é formado por gente amadora, que nunca teve inserção política. Portanto, está livre dos vícios que tomaram o sistema político brasileiro como uma epidemia de cupim. São brasileiros comuns, profissionais liberais de todas as origens.
O Novo tem sido chamado de "queridinho do mercado financeiro". Ele realmente tem arregimentado essa parcela?
Se você for à França perguntar o que gente do mercado financeiro pensa sobre o [presidente Emmanuel] Macron, vai chegar à conclusão de que ele é o queridinho do mercado. Na Argentina, vai ser o mesmo com o [Mauricio] Macri. Aqui é parecido. Essa associação é trazida com o intuito de denegrir, mas é um fato da vida.
O mercado financeiro traz o pensamento médio de quem tem dinheiro e quer que o país cresça, prospere. As pessoas que estão interessadas na prosperidade do Brasil gostam do conceito trazido pelo Partido Novo. É dessa forma que se deve entender a preferência.
Os críticos ao Novo argumentam que ele é pequeno, jovem e, sobretudo, idealista nas propostas para a economia e para a política. Como o sr. avalia essa leitura?
Vejo com absoluto encanto o fato de podermos, em muitos assuntos, na política, começar do zero. As velhas raposas políticas dizem: agora vocês precisam colocar as mãos na lama. A resposta é: não. É para fazer a coisa certa. Se não der para fazer o certo, poderemos perder eleições. A disputa eleitoral parece cheia de lamaçais, dizem as raposas. Pois bem, acho que a ideia do partido é enfrentar esses problemas.
E qual seria a sua agenda reformista neste momento?
Tem diversas frentes. Duas são da maior importância e urgência. Uma agenda é a da sustentabilidade fiscal do Estado. Temos de reformar as instituições públicas para que seus gastos caibam na receita.
A segunda, de abertura e competitividade. O Brasil permanece a economia mais fechada do mundo, a despeito de ter dentro de casa todas as empresas multinacionais importantes do planeta, operando constrangidas, para atender a satisfação do mercado interno, com alto conteúdo nacional e isoladas das cadeiras internacionais de valor que criaram a globalização.
Essas duas agendas se conectam. Exatamente no meio está o Estado empresário, que funciona mal, está superdimensionado. Tem muita empresa estatal. Muitas poderiam virar de capital aberto, sem controlador. Outras poderiam simplesmente fechar.
Mas, basicamente, não são as propostas do atual governo?
Elas se parecem. As diferenças estão nos detalhes, na execução. O desejo de ir mais fundo vai ser o diferencial. O Novo pretende apresentar propostas radicais. Esse governo, em nível de retórica, sim, trouxe temas até impressionantes, como a privatização da Eletrobras. E é revelador que um governo do PMDB, que nunca teve afinidade com esse tipo de temática, agora apresente essas coisas com um jeito oportunista muito evidente. É porque os ventos sopram nessa direção. Querem apelar ao público que não é o do PMDB.
É claro que, para quem defende essa agenda, pouco importa que o PMDB esteja fazenda certo pelas questões erradas. O que ocorre hoje é que as pessoas, diferentemente do passado, estão dispostas a, ao menos, ouvir ideias novas: fim da estabilidade do funcionalismo, privatização da Petrobras... A população agora está disposta a ideias mais radicais, disruptivas, para usar uma palavra da moda.
E, dentro dessa tendência disruptiva, o sr. pretende se candidatar na próxima eleição?
Não. Tanto que fui para um cargo de direção e, pelas normas do partido, quem está nesses cargos está impedido de concorrer. Com informações da Folhapress.
Via...Notícias ao Minuto
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