O Hospital das Clínicas, depois de receber algumas doações que permitiram reformas de alas inteiras (leia mais nesta página), desenvolveu uma metodologia de elaboração de projetos
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Em comparação com os Estados Unidos, é normal se ouvir que o Brasil tem pouca ou quase nenhuma cultura em doações. Mas esse pouco - que em alguns casos chegam a ser doações milionárias - tem feito a diferença para o funcionamento de hospitais de excelência de São Paulo que atendem pelo SUS, como Hospital das Clínicas, Incor e A.C. Camargo. Começa a ganhar força um movimento em várias dessas instituições para profissionalizar seus mecanismos de captação de doações.
O Incor, por exemplo, planeja lançar até o final do ano o programa Incor+100 que tem a expectativa de alcançar, em algum momento no futuro próximo, um volume de R$ 100 milhões em doações por ano.
O Hospital das Clínicas, depois de receber algumas doações que permitiram reformas de alas inteiras (leia mais nesta página), desenvolveu uma metodologia de elaboração de projetos para captar de modo mais consistente em várias áreas.
E o A.C. Camargo Cancer Center - que vinha contando só com doações de empresas por meio de projetos de incentivos fiscais - também está abrindo um escritório especificamente para fazer a busca ativa por doadores.
Até não muito tempo atrás, essas instituições se valiam, por um lado, dos bons contatos de médicos de ponta que também atendem nos principais hospitais privados da capital, e por outro de filantropos que se dispunham a doar por conta própria. É o que agora se busca mudar.
"Doações são sempre bem-vindas, mas o que recebemos hoje ainda é muito pouco, principalmente porque não temos uma estrutura de captação própria", afirma Roberto Kalil Filho, presidente do conselho diretor do Incor. Entre 2010 e 2017, doações de pessoas físicas e jurídicas somaram cerca de R$ 10 milhões. "Queremos quintuplicar já no próximo ano", diz.
O trabalho de profissionalização das captações foi iniciado há dois anos. No começo de 2018, foi criado um Comitê Comunitário, coordenado pelas organizadores de eventos Bia Aydar e Fabiola Lutfalla, que passou a liderar o esforço de arrecadação para projetos prioritários. Um deles é a reforma da cozinha, estimada em R$ 20 milhões. Outro é a criação de um centro de cardio-oncologia, para estudar os efeitos colaterais de químio e radioterapia no coração.
Além da busca ativa por doadores, outras estratégias de arrecadação são o lançamento de uma campanha publicitária para tornar o Incor mais conhecido - doada pela agência África - e um serviço "tipo Teleton" para o recebimento de doações por um telefone 0500, em análise no Ministério das Comunicações.
Metodologia
A necessidade dessa profissionalização é algo foi percebido já há algum tempo pelo urologista Miguel Srougi, professor da Faculdade de Medicina da USP. Ele era professor da Escola Paulista de Medicina quando conseguiu sua primeira grande doação - R$ 13 milhões, em 1998, para uma reforma no Hospital São Paulo.
"Resolvi me envolver. Estudei bastante porque há muito espaço para isso, mas ainda não temos a cultura. Fui entender os princípios de fundraising, de como é preciso ter experiência e tocar fundo os doadores", diz.
Srougi desenvolveu uma metodologia para elaborar projetos e levou a experiência para o HC. Uma das doações conseguidas, de R$ 5,3 milhões, permitiu reformar a pediatria da Urologia. É um projeto que melhorou a qualidade de vida de crianças como Davi Lukas, de 4 anos, que nasceu com síndrome de Prune Belly, sem testículos nem pênis.
"Foram duas cirurgias logo que nasceu (no interior de Minas, onde vivem), e aguardamos a terceira aqui", conta a mãe, Luciene Maria dos Santos. No hospital, ela só conseguia descontraí-lo na brinquedoteca. Sua diversão era desenhar peixinhos.
Ajuda privada
Foi durante um tratamento de linfoma no Hospital Sírio Libanês há cerca de dois anos que o empresário José Roberto Lamacchia, dono da Crefisa, tomou conhecimento de um dilema do hematologista Vanderson Rocha.
O médico, que coordena a área de transplantes de medula óssea no hospital particular, tinha recentemente assumido a diretoria do Serviço de Hematologia do Hospital das Clínicas da USP e estava tentando lutar contra o fato de que havia muitos casos de infecções entre os internados do setor.
"São pacientes imunodeprimidos, que ficam um mês internados depois do transplante, e vi que precisa de algumas mudanças para poder fazer medicina de ponta ali", conta. "Mas em tempo de crise é difícil ter apoio público." Seu cunhado Marcelo Oliveira era então técnico do Palmeiras, time patrocinado pela Crefisa. Uma coisa levou à outra e Rocha conseguiu apresentar um projeto de modernização da ala para o casal Lamacchia e Leila Pereira.
"Fui conhecer o HC, o trabalho do Vanderson e vi a situação que estava a hematologia. Era absurdo o Beto (José Roberto) poder ser tratado de modo tão impecável e o HC daquele jeito. Falei para ele que a gente precisa ajudar. Quando passamos por algumas provações, têm de ter um porquê", conta Leila. Era o início de uma parceria que resultou em cerca de R$ 35 milhões e a reforma de duas alas do hospital, previstas para serem inauguradas em agosto.
A enfermaria de 12 leitos da Hematologia foi toda reformulada e ganhou um sistema de automação, com filtragem do ar e da água, além de mobiliário e banheiros mais fáceis de limpar. Mas o ganho do qual Rocha mais se orgulha parece até simples: a garantia de que médicos e enfermeiros vão fazer uma boa higienização antes de ter contato com os pacientes mais debilitados.
"Antes de entrar no quarto eles passam por uma antecâmara com um sensor que mede o tempo em que o médico lava as mãos. A porta nem abre se lavar a mão por menos de um minuto", explica.
Ao saber da doação, o urologista William Nahas, também médico de Lamacchia no Sírio, levou para ele um projeto de reformulação do setor de transplantes de rim do HC. "A gente chora para todo mundo. Fazia 40 anos que o setor não passava por uma modernização. O Zé Roberto e a Leila acabaram abraçando a ideia e a área foi totalmente reconstruída", diz.
A enfermaria de transplantados, que tinha 20 leitos, passou a ter 24, em 12 quartos climatizados e com banheiros, além de uma estrutura mais humanizada. "Tira um pouco a cara de quarto de hospital", comenta o médico, sobre o fato de os equipamentos de gases ficarem escondidos na parede. Também foram doados móveis e camas.
Multiplicação
Os dois projetos incentivaram outros departamentos a também buscarem recursos de doações. O centro de engenharia e arquitetura do hospital, que coordenou as duas reformas, vem usando a experiência adquirida para desenvolver estudos e fazer outros projetos. Já estão na fila a Otorrinolaringologia, a Endocrinologia e a Geriatria. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Via...Notícias ao Minuto
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