William Dib defende que a agência volte a analisar propostas de alertas em rótulos de alimentos com cores verde, amarela e vermelha conforme o teor de sal, açúcar e gorduras
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Até então, esse modelo havia sido descartado por técnicos da agência. Para Dib, a troca de relator da proposta traz um novo cenário.
"Estamos em um país democrático e livre. Defendo o direito de discutir essa ideia. A consulta pública ocorrerá, gostem do amarelo ou não."
Segundo ele, uma mudança na rotulagem é "questão de anos, não de meses".
Em outra frente, Dib diz que, após atrasos, a agência deve começar discutir ainda neste ano uma proposta para regulamentação do cultivo da maconha.
O debate, porém, deve valer inicialmente apenas para fins de pesquisa científica.
Seu antecessor, Jarbas Barbosa, chegou a dizer que a agência previa incluir na proposta uma regulação para uso medicinal, por meio de empresas ou parcerias entre universidades e associações de pacientes, por exemplo.
"Fizemos uma proposta de iniciativa. Isso está na diretoria de regulamentação para análise, e depois deve ir para a diretoria. Mas só para fins de pesquisa científica. Não há nenhum outro fato por enquanto, nem consumo nem uso medicinal", disse à reportagem.
Questionado sobre quais serão suas propostas à frente da agência, Dib afirmou que pretende investir em tecnologia da informação para monitoramento de produtos que já estão no mercado.
Para ele, a agência também deve à sociedade uma discussão sobre a regulamentação dos cigarros eletrônicos.
"Não podemos fingir que isso não existe ou que não está, por meios eletrônicos, sendo vendido em vários pontos do país. Eu acho que a Anvisa precisa ter uma resposta", afirmou.
Ele evitou, no entanto, posicionar-se sobre uma eventual liberação desses produtos, vetados pela agência desde 2009. Pergunta - A Anvisa discute hoje uma regulamentação dos cigarros eletrônicos. Como o sr. vê essa questão?
Dib - Acho que a Anvisa está devendo isso à sociedade. Não podemos fingir que isso não existe ou que nos meios eletrônicos não está sendo vendido em vários pontos do país. A Anvisa precisa ter uma resposta. Não tenho condição de responder sobre um prazo, mas estamos estudando, e isso vai ter que sair, porque é uma obrigação nossa para a sociedade.
Hoje existe uma norma da Anvisa que proíbe esses produtos. Significaria então flexibilizá-la?
Dib - Pode ser até que seja para endurecer. Temos que estudar frente aos novos modelos e tecnologias, alternativas e experimentos clínicos. É normal. De vez em quanto temos que rever nossas posições. Mas pode ser que seja até para dificultar. Não quer dizer que vamos nos render. Temos que estudar esse tema.
Mas se hoje já há uma proibição, não há como dificultar mais, ou há? Como a proibição, o sr. acha que o Brasil perde por evitar essa discussão?
Dib - Sou médico e sou contra o uso do tabaco. É uma posição difícil de mudar. Se provar para mim, o que ninguém ainda me provou, que o cigarro eletrônico e tabaco aquecido podem reduzir os malefícios do cigarro e dar segurança para a população, vou ver com outros olhos. Hoje, não conheço nenhum estudo que prove isso. Não tenho instrumentos para dizer que o Brasil deve seguir um caminho ou outro.
Vários países estão liberando, mas vários ainda proíbem. Se for olhar na internet, vai ver que tem oferecimento desses produtos. Temos que acelerar os estudos, verificar novas publicações científicas isentas e fazer algo consolidado para o bem da população.
Alguns diretores já disseram que iam propor a regulamentação do cultivo da maconha [nos casos previstos em lei]. Mas a proposta ainda não saiu. Como vê esse tema?
Dib - A Dimon [diretoria de controle e monitoramento sanitário], que é a diretoria que exerço, fez a proposta de iniciativa. Isso está na diretoria de regulamentação para análise, e depois deve ir para a diretoria colegiada. Mas só para fins de pesquisa científica, não para cultivo da Cannabis. Se colocar aí que é cultivo, vão dizer que estamos liberando a Cannabis no Brasil.
Mas houve um momento em que se falou da possibilidade de liberar o cultivo para fins medicinais, como para empresas ou universidades em parceria com associações de pacientes.
Dib - Tenho impressão que o relator que for escolhido poderá agregar outros assuntos. Mas o assunto da iniciativa é só pesquisa científica. Não há nenhum outro fato por enquanto, nem consumo nem uso medicinal.
Há uma perspectiva de quando isso deve ser discutido?
Dib - Não tive oportunidade ainda de verificar. O que posso dizer é que isso não ocorrerá em outubro devido a viagens dos diretores. Talvez em novembro ou dezembro.
O sr. tem declarado que pretende propor uma advertência nos rótulos com cores vermelha, amarela e verde, nos moldes do que defende a indústria de alimentos. Por quê?
Dib - O que quero dizer é que tudo é possível, senão não teria consulta pública. Isso não está vetado. O motivo de se fazer uma nova resolução é que hoje as tabelas nutricionais são incompreendidas pela população. Não adianta falar que não tem problema, porque tem. Se alguém quer consumir menos sódio, tem que ser um gênio de pegar três batatinhas e saber qual tem menos sódio, porque um é por kg, outro por grama e outro por porção. O objetivo antes de mais nada é padronizar isso. É ter tabelas de produtos em que possa dizer: esse tem menos sódio, esse tem menos gordura, esse tem menos açúcar. É uma coisa educativa e inteligível para a população.
Vamos falar agora dos alertas. O Ministério da Saúde quer que se consuma cada vez menos sódio. Qual a quantidade que vamos colocar em vermelho, verde e amarelo? Aqui ninguém veta que possa ter [cores] ou não. Isso vai ser definido na consulta pública. Ela ocorrerá, gostem do amarelo ou não. Pode ser por cor, pode ser por lupa. Mas acho importante que esse modelo seja analisado e discutido. Estamos em um país democrático e livre. Defendo o direito de discutir essa ideia.
Relatório da equipe técnica, porém, chegou a dizer que esse modelo não estaria entre as propostas da Anvisa [por ser confuso]. O mesmo foi dito pelo ex-presidente da agência.
Dib - Mas ele saiu e mudou o relator. Não podemos imaginar que isso seja vetado. Na tomada de subsídios também colocamos o modelo do Chile, do Peru. Não temos por que esconder os modelos do mundo. Essa é uma discussão ampla. Vai demorar um tempo para entender o que sai da consulta, e um tempo maior para implantação. Não podemos achar que vai acontecer da noite para o dia.
Dos modelos em análise, tem algum que o sr. prefere?
Dib - Não tenho nenhum. Como sou médico, minha formação é a tabela. O modelo de alerta é um segundo impacto. Sempre pergunto para os técnicos: como vão fazer esse alerta em produtos de tamanhos tão diferentes? Tem um modelo de alerta que caiba numa embalagem de bala? Precisamos ter um pé na realidade.
Acha então que deveria haver modelos diferentes para produtos diferentes?
Dib - Eu tenho que ser lógico. Uma coisa é a tabela de conteúdo. Outra coisa é o alerta. Isso é uma discussão da consulta pública que deve ocorrer até início de novembro.
E quando devemos de fato ter uma mudança nos rótulos?
Dib - Acredito que a consulta pública deve demorar de 60 a 90 dias. Já a leitura dessa consulta deve ser muito demorada porque deve ter milhares de contribuições, e só aí vai ser feita uma nova redação [de norma]. Quando for feita, o mercado regulado vai ser chamado novamente, para ninguém falar que foi surpreendido.
Supondo que haja consenso, quando pode entrar em vigor? Temos que falar de anos. Não podemos falar de meses, porque tem impacto importante na produção dessas embalagens e no escoamento das antigas. O prazo vai depender das mudanças e dificuldade de implantação. O Canadá, por exemplo, fez em cinco anos.
Mas no resultado preliminar da tomada de subsídios, a maior parte das pessoas avaliava que o prazo ideal seria de até um ano. A Anvisa não pode acabar tomando uma decisão muito distante do que pede a população?
Dib - O Brasil tem mania de fazer prazo de um ano, de seis meses, e depois quando chega na véspera vem o pedido para prorrogar. Não acredito que um ano seja um prazo compatível com a realidade. Quem mandou ser velho? Minha experiência não permite. Lógico que se as modificações forem pequenas, vai ficar como está. Vai ser só tabela? Se for só isso, pode ter um impacto diferente. Mas não podemos fazer um prazo que sabemos que não vai ser cumprido.
Como vê a inclusão desses alertas no rótulo dos alimentos? Eles devem ocorrer?
Dib - Para determinados produtos, pode ser importante, como para prevenir hipertensão, por exemplo. Mas não sei sobre ideia de homogeneizar os alertas. Essa avaliação pode ser feita na consulta pública.
Defende outras mudanças?
Dib - O que a gente precisa é homogeneizar a medida na tabela nutricional, a mensuração [da quantidade dos ingredientes].
Entidades defendem que essa medida seja de 100g, mas a indústria defende que seja por porção de alimento.
Dib - Pessoalmente, acho que por 100g é mais inteligível. Não consigo entender quanto é uma porção. Se não houver uma medida comparável, não vamos sair do lugar.
Na quarta (26), em uma briga que vem desde o início do ano, o Ministério da Saúde acusou a Anvisa de reter mais de 6.000 unidades do Soliris, um medicamento para doenças raras. O que levou a esse bloqueio?
Dib - A Anvisa agiu dentro da lei. A empresa trouxe o produto de uma outra planta que o registro não concebia. Ela tem registro de duas plantas internacionais, e resolveu trazer de uma terceira. Então foi brecado na alfândega porque a empresa usou de uma alternativa e não tinha licença para isso.
As secretarias que fizeram a compra entraram com pedido de alternativa de excepcionalidade. Isso avançou bastante porque entendemos a precariedade de abastecimento do mercado. Tenho impressão de que será liberado em poucas horas, agora está em fase de avaliação. Ninguém aqui prevaricou ou deixou de atender. Nós cumprimos a lei, e até parabenizo quem fez isso, porque é o que a lei manda. A Anvisa não trabalha contra o Ministério, trabalhamos a favor da segurança.
Mas o fato de trazer de uma terceira planta não autorizada traz riscos?
Dib - Descobri hoje que a empresa entrou com pedido de licenciamento dessa outra planta. Vou usar das minhas atribuições e por excepcionalidade vou conceder, porque isso já está em análise. Acho que o risco é reduzido e a importância da substância já estar em território nacional poder ser utilizada pelos doentes supera esse tipo de problema. O importante é o doente receber a medicação.
O ministério tentou várias vezes nos últimos meses rever as regras de importação, dizendo que a exigência desses documentos não seria necessária.
Dib - Não podemos rever essa regra. É uma regra da economia mundial. Não podemos imaginar que um ente jurídico, importador ou não, possa comprar um produto que não detém o registro sem autorização ou licenciamento. Se isso ocorrer, vamos triturar o mercado como um todo. E o Brasil será punido internacionalmente, porque é signatário de vários acordos comerciais. Você não pode mesmo a título de saúde pública comprar produto que o detentor do registro seja outro. Para que dar declaração de detentor de registro se pode comprar sem? Isso destruiria a segurança jurídica do país.
Entraria num cenário muito grave. E levaria a compras que tem origem até de produto falso. Como vamos comprar uma coisa que não detemos nem o poder de investigar?
Mas permitir a compra agora de forma excepcional, sem o DDR [declaração de detentor de registro], não pode trazer esse risco?
Dib - Não, porque o produtor é o mesmo, que tem o licenciamento em duas plantas, uma na Itália e outra em Singapura. E já entrou há meses com pedido na Espanha. Isso mostra boa fé da empresa. É um produto que não podemos ficar brincando de não tem. O risco que a Anvisa pode estar assumindo é baixo perante a importância do produto.
Quais devem ser suas prioridades à frente da presidência da agência?
Dib - A agência já avançou em vários setores. Hoje é reconhecida internacionalmente, e tem trabalhado para homogeneizar suas ações e ter transparência e diálogo com o setor. E os gargalos que existem vão ser enfrentados. O maior é de infraestrutura, de TI [tecnologia de informação], que precisamos remodelar. Temos várias gerências com dificuldade de realizar suas ações por conta disso.
Que áreas são mais afetadas? E que tipo de dificuldades?
Dib - Na prática, todas. Começando como portos, aeroportos e fronteiras, que passa por vários apagões, pela rastreabilidade de produtos e principalmente com o novo modelo de farmacovigilância. O mundo todo se direciona hoje mais para pós-mercado do que no registro e pré-requisitos para a liberação dos produtos.
Falta então fiscalização e análise do que já está no mercado?
Dib - Isso só ocorrerá no momento em que tiver um instrumento tecnológico em que todos os fornecedores e usuários tenham acesso a informações, como alterações inesperadas de determinados produtos, por exemplo. Só com informação eletrônica, rápida e ágil vamos poder monitorar o mercado.
Seu antecessor, Jarbas Barbosa, criticou antes de deixar o cargo a excessiva interferência política na nomeação de diretores. O sr. era filiado ao PSDB. Como vê essa questão?
Dib - Não sou mais filiado. Fui prefeito [de São Bernardo do Campo, em SP] e fui deputado federal. Mas, antes disso, fui médico e secretário de saúde e exerci sempre minha profissão. Não conheci nenhum diretor que chegou sem indicação política. A indicação é política. Mas hoje não tenho nenhum tipo de vínculo político e partidário. Antes de chegar Anvisa, não era mais filiado a nenhum partido.
O presidente Michel Temer, que o indicou, fez algum pedido específico para o sr.? Conversou sobre seu mandato à frente da agência?
Dib - Sim. Ele falou em termos da modernidade da agência, de que precisaria avançar na qualidade de prestação de serviço, de não ser óbice econômico no país, mas sim uma agência moderna que possa atuar favorecendo crescimento econômico sem deixar de ver segurança, qualidade e eficácia para a população na área da saúde. A Anvisa não pode ser obstáculo para nada, mas tem que ser parceira na qualidade. Com informações da Folhapress.
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