A nova gestão tucana contratou uma auditoria
© Heloísa Ballarini / SECOM |
O resultado da apuração, que será feita em até quatro meses pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), órgão do próprio governo, vai apontar o estágio real da obra herdada das gestões dos ex-governadores Geraldo Alckmin (PSDB) e Márcio França (PSB) e alvo de investigação da Polícia Federal e do Ministério Público Federal por suspeita de desvios, corrupção e lavagem de dinheiro que já colocou ex-diretores da Dersa no banco dos réus.
No início de maio, Doria rompeu os três últimos contratos da obra iniciada por Alckmin em 2013, que deveria ter sido concluída em fevereiro de 2016 por R$ 6,5 bilhões. Segundo registros da Dersa, a construção do último trecho já consumiu mais de R$ 10 bilhões sem estar concluída, e a obra está paralisada. França já havia rescindido contratos dos três primeiros lotes em dezembro de 2018. O relatório do IPT deve servir de base para licitar o término do trecho de 47,6 km para ligar as rodovias Presidente Dutra e Bandeirantes e o Aeroporto de Guarulhos.
Os contratos rescindidos em dezembro se referem aos lotes 1, 2 e 3 com a OAS e o consórcio formado pela Mendes Júnior e a Isolux/Corsan. No início de maio, foram rompidos os contratos com a espanhola Acciona e o consórcio Construcap e Copasa. Executivos da OAS e da Mendes Júnior, empreiteiras que têm os contratos com maiores problemas já detectados, fizeram delação premiada, mas não há notícia de que tenham mencionado o Rodoanel Norte.
Reajustes
As rescisões ocorreram porque o governo não acolheu o pedido de "reequilíbrio econômico-financeiro" dos contratos feito pelas empreiteiras, que alegam não ter condições de concluir a obra sem novos reajustes. Foram justamente aditivos contratuais assinados em 2015 que resultaram na prisão e denúncia contra o ex-secretário Laurence Casagrande e de ex-dirigentes da estatal no ano passado por suspeita de desvios de R$ 600 milhões. Indícios de superfaturamento nos serviços de terraplenagem foram revelados pelo Estado em 2016. Casagrande nega as acusações.
Agora, o próprio governo admite a possibilidade de que pagamentos indevidos tenham ocorrido em gestões anteriores. O Estado apurou que a Secretaria de Transportes e Logística identificou serviços lançados nas planilhas da Dersa como concluídos e integralmente pagos, que, na prática, não foram concluídos.
Um exemplo é um trecho do lote 3, da empreiteira OAS, que, segundo a planilha, já está totalmente conectado, mas, na prática, ainda existe uma montanha rochosa separando o viaduto da entrada do túnel - cenário constatado in loco pela reportagem. Há também indícios de que os serviços de edificação estariam em desacordo com o especificado no projeto e lançado como executado para pagamento. A suspeita é que foram feitos adiantamento de pagamentos para as empreiteiras, com lançamento irregular de conclusão dos serviços nos registros da Dersa.
O rompimento dos contratos, paralisação total das obras e as descobertas preliminares de irregularidades fazem parte do pente-fino na obra determinado por Doria no início do governo. Seis mapas que identificam contratos e serviços registrados nos arquivos da Dersa serão base para o trabalho do IPT.
O material está com os técnicos desde a semana passada. Eles vão confrontar o que está efetivamente realizado no trecho de 47 quilômetros de rodovias, atestar a qualidade e cruzar com o registrado nos arquivos da Dersa, que serviram para pagamentos das empreiteiras.
Com recursos da União (R$ 2,5 bilhões), do Estado (R$ 700 milhões) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (R$ 3,3 bilhões), as suspeitas do MPF e do governo são de que as obras podem ter replicado o esquema de desvios e corrupção descoberto nos contratos do trecho Sul do Rodoanel - que resultou na prisão do ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza, suposto operador do PSDB.
Além do levantamento do IPT, o governo encomendou um estudo financeiro externo para os aditivos dos contratos e os pagamentos feitos. A reavaliação busca identificar agentes públicos envolvidos em supostas fraudes e falhas de fiscalização e gerenciamento da obra.
O governador, segundo apurou o jornal O Estado de S. Paulo, cobrou a conclusão da obra, mas quer blindar a atual gestão caso sejam confirmados problemas. Só com a finalização do estudo e a definição dos custos para conclusão é que a Secretaria de Transporte vai propor a retomada das obras. A relicitação dos contratos é uma das saídas em estudo.
O resultado do pente-fino também será encaminhado à Controladoria do Estado. Pelos mapas, cerca de 85% do trecho está executado e mais de 90% pago. As suspeitas, no entanto, são de que o porcentual necessário para conclusão da obra seja maior do que o registrado.
Responsáveis negam irregularidades
O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou, em nota, que as obras do Rodoanel Norte foram "contratadas com desconto médio de 26% em benefício do Estado" e que "o IPT já estava contratado desde 2010 para apoiar tecnicamente" o projeto. A assessoria disse ainda ser "natural" a Dersa não ter o certificado de conclusão porque ele "só é entregue após o término da obra".
A nota diz ainda que a Dersa contratou seis empresas para supervisão da obra e "as medições só eram pagas se as supervisoras atestassem a conformidade técnica do que foi feito".
Em nota, Márcio França afirmou que "todos os contratos, com suas respectivas formas de pagamento, foram firmados antes do período Márcio França."
A Secretaria de Logística e Transportes afirmou que iniciou em janeiro uma análise das obras paralisadas no Estado e, no caso do Rodoanel, a gestão da Dersa assumiu este ano com os contratos dos lotes 1, 2 e 3 encerrados, e foi verificado que a continuidade dos outros três lotes era inviável.
A OAS afirmou que desconhece ter recebido pagamentos indevidos da Dersa e que, "ao contrário das alegações", executou serviços "além do contratado, sem a devida remuneração".
O consórcio Construcap/Copasa negou irregularidade em serviços no Lote 5 e que deixou de receber por serviços executados, "fato que será objeto de litígio entre o Consórcio e a Dersa". A Acciona não respondeu à reportagem e o consórcio Mendes Júnior/Isolux não foi localizado.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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