Trump chega ao fim deste mandato em meio a outros embates judiciais
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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Donald Trump passou os primeiros meses de seu governo, em 2017, em uma grande briga na Justiça para vetar imigrantes de alguns países. Agora, chega ao fim deste mandato em meio a outros embates judiciais, com a Suprema Corte barrando iniciativas que ele pretendia usar em sua campanha à reeleição.
Em junho, vieram derrotas em temas como imigração e direitos civis, assuntos caros aos apoiadores do presidente. Na segunda (29), a Suprema Corte decidiu retirar restrições ao aborto na Louisiana. Trump faz campanha aberta contra o procedimento e inclusive participou de uma marcha no começo do ano.
Na semana passada, a corte vetou o fim do Daca, programa que facilita a residência de imigrantes que entraram de maneira ilegal nos EUA quando crianças e cresceram no país, e determinou que gays e transexuais não podem sofrer discriminação no trabalho.
O tribunal também se negou a julgar dez apelações de casos de porte de armas. Grupo armamentistas consideravam esses processos um caminho para ampliar o escopo da 2ª Emenda e impedir estados de cercear a compra e o porte de pistolas e similares.
A Suprema Corte deve avaliar também o possível fim do Obamacare, programa de acesso à saúde criado por Barack Obama, e um pedido de Trump para que ele possa ocultar as suas declarações de renda, algo que ele busca esconder desde a campanha de 2016 e que pode trazer embaraços durante a campanha.
Pesquisas recentes têm mostrado queda nas intenções de voto para o republicano. Segundo o site FiveThirtyEight, o democrata Joe Biden tem atualmente 50,6% da preferência, contra 41,4% de Trump, e os reveses na Corte enfraquecem a imagem do presidente.
Entretanto, ele tenta transformar as derrotas em um ativo eleitoral. Se pautas conservadoras não avançam por culpa do Judiciário, está aí mais uma razão para votar no republicano: caso reeleito, nomeará mais juízes simpáticos às causas conservadoras.
Espera-se que dois magistrados saiam nos próximos anos, mas essa não é uma certeza: cabe a cada um decidir quando se aposentar. São eles Ruth Ginsburg, 87, e Stephen Breyer, 81, nomeados pelo ex-presidente democrata Bill Clinton e de postura progressista.
Trump indicou dois juízes conservadores para a Suprema Corte em seu mandato, mas isso não foi suficiente para lhe garantir vida fácil.
O tribunal tem hoje cinco nomes considerados conservadores e quatro progressistas. Mas John Roberts, atual presidente e considerado conservador, passou a votar com a ala oposta em vários temas.
Também passou a criticar o presidente. Escreveu, por exemplo, que o modo como Trump tentou encerrar o Daca continha falhas legais "arbitrárias e caprichosas".
Roberts, no entanto, segue dando sinais de proximidade aos conservadores. Nesta terça (30), foi a favor de que escolas religiosas também possam receber auxílio do Estado em meio à pandemia. Seu voto desempatou a questão.
O chefe da corte tem sido atacado por senadores republicanos, que o acusam de agir de modo político. Trump foi às redes sociais, fez críticas na mesma linha e buscou mobilizar apoiadores. "Essas decisões horríveis e políticas vindas da Suprema Corte são tiros de rifle na cara das pessoas que são orgulhosas de chamarem a si mesmas de republicanas ou conservadoras", disse na semana passada.
Embora com diferenças, os embates de Trump e a atitude de colocar a Justiça como um inimigo lembram os embates entre o governo Jair Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal.
"Nos EUA, estão em debate questões constitucionais e de direitos civis, que vêm de longa data e transcendem o governo Trump. No Brasil, o que preocupa Bolsonaro são casos criminais, como o possível envolvimento de filhos dele", avalia Rafael Mafei, professor de direito na USP.
"A reação também é diferente. Aqui temos um presidente invocando intervenção militar. Trump não chegou nem perto disso", compara.
Para Conrado Hubner Mendes, pesquisador do Laut (Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo) e colunista da Folha de S.Paulo, há nos dois casos uma estratégia de "inundação": criar muitas medidas com conteúdo potencialmente ilegal em pouco tempo.
Assim, a Justiça tem um custo político maior para confrontar o governo tantas vezes seguidas, e aumenta a chance de que juízes evitem ou adiem decisões polêmicas para se preservar. "É uma estratégia deliberada de desgaste, mas a Suprema Corte americana tem mais força institucional para resistir", diz Hubner.
Apesar das derrotas, o republicano teve algumas vitórias recentes na corte, como a autorização para manter o programa que obriga imigrantes requerentes de asilo a esperarem uma decisão no México, e não nos EUA. Também pôde seguir com alguns planos graças a decisões provisórias.
Medidas como o veto a viajantes de alguns países islâmicos e o uso de dinheiro reservado para outros fins para construir um muro na fronteira foram barrados por instâncias inferiores. Essas decisões, embora suspendam as negativas da primeira ou segunda instância, não necessariamente dão respostas de modo a pacificar a questão.
Um levantamento feito por Stephen Vladek, professor de direito do Texas, mostrou que Trump usou essa estratégia ao menos 29 vezes. Conseguiu autorização liminar em 17 casos. "Essas decisões abrem caminho para que o presidente siga com suas políticas mais controversas sem que haja uma decisão final sobre a legalidade delas", alertou Vladek, em artigo no New York Times.
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