O plano inicial era que fossem vacinados trabalhadores de saúde, idosos acima de 75 anos ou asilados, população indígena e povos ribeirinhos, que somam 14,8 milhões de pessoas
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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Faltam vacinas para todos, mas sobram acusações, desconfianças e reclamações sobre quem está recebendo as doses na primeira fase da campanha de imunização contra o coronavírus.
O plano inicial era que fossem vacinados trabalhadores de saúde, idosos acima de 75 anos ou asilados, população indígena e povos ribeirinhos, que somam 14,8 milhões de pessoas. Ainda longe dessa quantidade de vacinas, nem mesmo os trabalhadores da saúde estão sendo todos contemplados.
Na primeira semana de vacinação, a angústia ante a escassez de imunizantes também se expressou no medo e na revolta em ser preterido na fila da vacina. O Hospital das Clínicas da USP, na capital, virou o centro das reclamações. O secretário municipal de Saúde, Edson Aparecido, chegou a dizer que o hospital estaria sendo privilegiado no calendário de imunizações.
Fotos de funcionários da área administrativa e de institutos que, a princípio, não teriam contato com pacientes infectados correram em grupos de WhatsApp e revoltaram servidores municipais e estaduais de outras instituições.
Uma delas, por exemplo, de um psicólogo do Instituto de Psiquiatria, do HC, causou indignação em funcionários da rede. A reportagem recebeu a informação de que ele não faria parte da linha de frente do combate à doença no complexo médico.
À reportagem o profissional afirmou que faz o atendimento psicológico de médicos e enfermeiros da UTI impactados pela sobrecarga de trabalho e perda constante de pacientes. Segundo ele, há casos de médicos que o procuraram durante a pandemia após perder 15 pacientes em um só dia.
Ele reconhece não estar em contato direto com infectados, mas diz também estar exposto ao contágio por ter contato próximo com os profissionais que estão. Não são apenas esses que devem ser vacinados, defende o psicólogo, que pede para não ser identificado, uma vez que apenas seguiu a determinação do hospital e se vacinou após seu nome ser confirmado após "extenso procedimento de segurança".
Segundo ele, essa situação levou a colegas de outras instituições a procurá-lo para saber se poderiam também se vacinar no HC. Ele afirma que desencorajou os profissionais e explicou que entende a frustração de quem ainda espera pela imunização.
No HC da Unesp, em Botucatu (SP), referência no combate ao coronavírus, a imunização de um professor aposentado mas que seguia trabalhando na UTI causou revolta entre outros professores.
A revolta se deu porque o professor, que faz parte do grupo de risco, esteve afastado de suas funções no hospital e mesmo assim foi se vacinar nesta semana. A presença do médico Ubirajara Aparecido Teixeira, 71, no local de vacinação incomodou profissionais do hospital.
Em mensagem de áudio a que reportagem teve acesso, uma profissional chega a chorar ao relatar que o professor afastado estava sendo vacinado enquanto outras pessoas ainda esperavam.
Teixeria foi procurado pela reportagem, mas não retornou o contato até a publicação deste texto.
Essa, no entanto, não foi a única reclamação. A imunização de profissionais que não estariam na linha de frente do combate ao coronavírus e de outros professores sem ligação com o controle da pandemia também foram registradas.
O HC da Unesp recebeu do governo do estado 4.400 doses da vacina contra o coronavírus produzidas pelo Instituto Butantan, na capital. A instituição tem cerca de 5.000 profissionais, e essas doses –divididas em dua doeses– são suficientes para imunizar menos da metade dos funcionários.
OUTRO LADO
Sobre as reclamações no HC de São Paulo, a instituição afirma em nota que "para a campanha de vacinação que aconteceu esta semana no hospital, foram priorizados os profissionais com maior potencial de exposição à doença, que contabilizam cerca de 25 mil pessoas".
O HC afirma que após a vacinação 4.600 doses do imunizante serão colocadas à disposição da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e que "irá apurar os casos que eventualmente estejam fora dos procedimentos de vacinação".
A diretora do HC, Eloisa Bonfá, afirmou à reportagem que a antecedência explicaria o fato de o público interno do hospital atendido pela campanha ter sido amplo, gerando descontentamento em outras instituições de saúde que tiveram dificuldade de conseguir o imunizante para profissionais da linha de frente no atendimento da Covid-19.
Ela disse que o HC fez o seu programa interno de vacinação emergencial contra o novo coronavírus antes da notícia de que lotes de imunizantes que seriam importados da Índia e insumos da China ficassem bloqueados em seus países, tornando ainda mais escassa a quantidade de vacinas disponíveis aos hospitais da capital.
O HC da Unesp afirma, em nota, que o médico atua na UTI do hospital e reconhece que ele está afastado por problemas de saúde. No entanto, "como seu nome constava na lista do setor, recebeu a vacina no primeiro dia".
O hospital afirma que "eventuais denúncias sobre um possível fura-fila no processo de vacinação serão apuradas criteriosamente e, caso comprovadas, as medidas cabíveis serão tomadas pelo HCFMB".
Teixeira foi vacinado no primeiro dia da imunização no hospital. A instituição afirma que após esse dia, uma lista diária, elaborada por uma comissão, de quem deve ser vacinado passou a ser elaborada. "Após o primeiro dia do início do plano de vacinação, a comissão revisou criteriosamente a estratégia inicial e, em parceria com a Diretoria de Assistência do hospital, decidiu divulgar uma lista com cerca de mil nomes, elaborada pela própria Diretoria de Assistência, para dar continuidade da vacinação".
O HC da Unesp afirma que "estão sendo convocados profissionais que tem atividades frequentes e prolongadas com pacientes que estejam ou possam estar com diagnóstico de Covid-19".
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