A corte consolidou recentemente jurisprudência firme para casos de fake news e promete ser incisiva no combate a notícias falsas
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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O STF (Supremo Tribunal Federal) se prepara para enfrentar em 2022 a eleição em que estará mais em voga na história. O protagonismo das decisões judiciais, porém, deverá ficar no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Para magistrados, o tribunal estará em evidência mais do que em 2018, quando a Operação Lava Jato e o Judiciário tinham relevância na disputa. Cientistas políticos também apostam que o STF estará no centro das discussões.
A avaliação de magistrados em conversas reservadas é que embates com o presidente Jair Bolsonaro (PL) e a decisão de liberar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para disputar o pleito colocarão a STF como um dos temas centrais da campanha.
Bolsonaro tem repetido que o STF merece ser renovado e que o próximo presidente da República irá indicar dois ministros ao órgão em 2023. Tem dito ainda que, se reeleito, conseguirá fazer indicações suficientes para ter um STF alinhado ao governo.
Já o TSE deverá concentrar os julgamentos mais polêmicos após a maioria das investigações contra autoridades de renome saírem do STF com a restrição do foro e o enfraquecimento da Lava Jato.
A corte consolidou recentemente jurisprudência firme para casos de fake news e promete ser incisiva no combate a notícias falsas. Além disso, o TSE será presidido na eleição por Alexandre de Moraes.
O ministro é relator no STF das principais investigações contra Bolsonaro e aliados. Na eleição, ele deverá voltar a ser alvo da militância do presidente, o que reforça o papel de destaque que a cúpula do Judiciário terá na eleição de 2022.
Além dos embates com o chefe do Executivo por causa de ameaças golpistas, as decisões relativas à pandemia da Covid-19 também compõem o cenário que põe o STF no foco.
Logo após o surgimento da doença, em 2020, a corte decidiu que estados e municípios teriam autonomia para estabelecer medidas sanitárias a fim de conter o avanço do coronavírus.
Por todo o país, a maioria dos prefeitos e governadores aproveitou o poder concedido para determinar regras de distanciamento social e de uso de máscara e álcool em gel.
Os gestores seguiram recomendações médicas e, no início da pandemia, mandaram fechar comércios e escolas para que a população ficasse em casa. A medida contém a disseminação do vírus.
Bolsonaro, contudo, foi na contramão do consenso científico, criticou as iniciativas e defendeu a continuidade das atividades para que se atingisse a chamada "imunidade de rebanho".
Como não tinha poder para revogar as medidas de distanciamento decretadas pelos Executivos locais, o presidente ignorou as consequências que o desrespeito às medidas sanitárias teria e passou a apontar o Supremo como culpado pela crise econômica desencadeada pela pandemia.
Isso porque, segundo ele, a corte o impediu de agir no combate à Covid e não permitiu que ele baixasse decretos a fim de manter a normalidade para não deixar desaquecer a economia.
Com base nesse raciocínio, o presidente costuma dizer que não tem culpa pelos índices econômicos de sua gestão e tenta repassar a responsabilidade a ministros do STF, governadores e prefeitos.
Além da questão da pandemia, a decisão de liberar Lula para disputar o pleito também deve esquentar os debates. Neste caso, o STF viverá papel inverso ao protagonizado em 2018.
Na eleição passada, a corte tinha sido a responsável por, meses antes da eleição, determinar a prisão do petista. Mesmo preso, o ex-chefe do Executivo se manteve na disputa presidencial, e o TSE teve de cassar a candidatura com base na Lei da Ficha Limpa.
O PT, então, passou a acusar a cúpula do Judiciário de cometer ilegalidades e injustiça.
Agora, movimentos políticos indicam que será a vez de Bolsonaro apontar o Supremo como culpado por eventuais problemas eleitorais. Neste ano, após a decisão do STF a favor do petista, o chefe do Executivo já insinuou que há um complô no TSE e no Supremo para derrotá-lo.
A condução da eleição pelo TSE com o sistema eletrônico de votação deverá ser outro argumento do atual presidente contra a cúpula do Judiciário.
Neste ano, Bolsonaro já fez inúmeros ataques falsos às urnas eletrônicas e disse que a tecnologia pode ser usada para fraudar uma eventual vitória de sua chapa.
As chamadas pautas de costumes também poderão estar na mira do presidente.
O cientista político Christian Lynch, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), disse acreditar que decisões do STF como o reconhecimento do casamento gay serão outro fator que levarão a corte para o centro do debate eleitoral.
"Uma vez que a Lava Jato percebeu que o Supremo tinha um poder imenso, inclusive na agenda progressista, o populismo bolsonarista erigiu o tribunal como o inimigo, porque eles não podem controlar o tribunal. Eles podem controlar o Congresso, o Executivo, mas o Supremo não", afirmou Lynch.
Para o cientista político, a Constituição de 1988 tornou o Judiciário brasileiro o mais poderoso do mundo. Por isso, é inevitável que este Poder tenha papel central em qualquer debate político.
No entanto, por causa dos movimentos golpistas de Bolsonaro e das decisões do STF para conter o presidente, ele disse acreditar que a corte será ainda mais protagonista na próxima campanha.
Lynch afirmou que o desenho institucional do país leva o Supremo para o centro das discussões políticas.
"O STF é a cúpula do Judiciário para analisar recursos de tribunais inferiores e, ao mesmo tempo, é responsável pelo controle de constitucionalidade dos atos dos outros Poderes e ainda é o tribunal penal da classe política. Com tantas atribuições importantes, não tem como ser visto como neutro", disse.
Lynch espera reações do bolsonarismo.
"A militância bolsonarista vai atacar, dizer que o Supremo não presta e que é antidemocrático porque não reflete a maioria da população. Mas isso é papo furado, a maioria que eles falam diz respeito a 15%, 20% da população que vai tentar invadir o TSE e melar as eleições", disse.
Em recente entrevista à Folha, o cientista político e professor Fernando Abrucio seguiu a mesma linha e relacionou a vitória de Bolsonaro na indicação de André Mendonça para ministro do STF com o tema central da campanha do presidente à reeleição em 2022.
"O STF será parte da chamada guerra cultural, com a defesa de valores e a discussão moral, que será uma das estratégias políticas do Bolsonaro", afirmou.
Para Abrucio, o uso político-eleitoral da corte é sinal de enfraquecimento da democracia.
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