Com os juros subindo no Brasil e no exterior, investidores estão menos afeitos ao risco. Por isso, a quantia de dinheiro antes direcionado para empresas de tecnologia deve cair por um tempo.
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Segundo Fernando Cirne, presidente da Locaweb, isso ocorre porque a virada na economia fez os fundos fecharem a torneira dos investimentos. Agora, diz ele, o mercado está tendo um choque de realidade.
"Alguns estão ainda cobrando valores altíssimos, mas outros estão caindo na real. Quem não entender isso vai quebrar. Estamos no início de um momento difícil, e não no fim", afirma Fernando Cirne. "E esse momento vai trazer oportunidades."
Após dois anos de investimentos bilionários em startups por fundos de capital de risco (ou venture capital), o segmento passa por uma mudança. Com os juros subindo no Brasil e no exterior, investidores estão menos afeitos ao risco. Por isso, a quantia de dinheiro antes direcionado para empresas de tecnologia deve cair por um tempo.
Com menos recurso no mercado, startups e fintechs que dependem de aportes para seguir em crescimento terão de buscar alternativas. As medidas vão de cortes de custos à busca por um sócio que traga dinheiro novo.
Assim surgem as grandes empresas em busca de startups com desconto. "Para quem tiver dinheiro em caixa, a crise vai apresentar uma grande oportunidade, e as grandes empresas devem liderar esse movimento com o uso de ferramentas como os CVCs, ou corporate venture capital (fundos criados por empresas para aquisições)", diz Renato Mendes, sócio da consultoria F5.
Essas negociações entre startups e grandes negócios devem esquentar a partir do segundo semestre, já que a atividade econômica deve se desacelerar até lá. Um indicador que aponta nessa direção é justamente a criação desses fundos de aquisição no Brasil - hoje, o País já tem cem deles.
Entre os grupos abertos a fazer aquisições está o Bradesco. Em fevereiro, o banco concluiu a compra da Digio - pagou R$ 645 milhões por 50% do negócio. Outros negócios podem aparecer, segundo o presidente Octavio de Lazari Jr. "Nunca deixamos de olhar as oportunidades. Claro que, caso as empresas tenham reprecificações, vamos olhar com mais atenção", disse o executivo ao Estadão.
Número de fundos para investir em startups dispara
Diante da piora do cenário econômico, que deixa em posição mais frágil as empresas que ainda não dão lucro, o movimento de aquisições de startups deve esquentar no segundo semestre. Esse panorama tende a reforçar a participação dos fundos criados por grandes empresas - os chamados CVCs (Corporate Venture Capital) - para investimentos nessas companhias "nascentes".
Segundo levantamento da consultoria Bain & Company, o número de fundos do gênero de empresas brasileiras teve um salto de nove, em 2015, para 73 em 2021. Para este ano, segundo Andre Fernandes, sócio da Bain e gerente global para o braço de inovação da consultoria Brain Innovation Exchange, o total de CVCs no País deve ultrapassar a marca de cem.
Segundo Fernandes, os números seguirão crescendo à medida que a situação da economia se deteriorar, o que é previsto para os próximos meses.
A previsão se sustenta também na comparação dos investimentos das grandes companhias por meio de CVCs em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). "Essa relação nos Estados Unidos é de 0,45%, três vezes maior do que no Brasil (0,14%). Mesmo os americanos sendo referência, a proporção do Brasil mostra que ainda há muito espaço para esse investimento", diz o executivo.
Entre as empresas que decidiram abrir seu próprio "CVC" está a Locaweb, de serviços digitais. Em dezembro de 2021, a companhia direcionou R$ 100 milhões para esse fim, mas só usou 10% do total.
Segundo o presidente da Locaweb, Fernando Cirne, o objetivo do fundo é investir em negócios que tenham o potencial de se tornar eventuais subsidiárias da companhia.
Outra empresa de tecnologia que separou dinheiro para comprar startups foi a Stefanini, pela Stefanini Ventures. Com a política de comprar participações - mas sem interferir no dia a dia da operação -, a Stefanini tenta deixar as startups livres para a criação de tecnologias disruptivas, afirma o fundador e presidente Marco Stefanini. Desde 2020, a empresa investiu mais de R$ 500 milhões em aquisições.
Diante do potencial do mercado, o fundador da Stefanini está criando um novo fundo, que ele pretende manter independente. A ideia é atender à crescente demanda de startups que não necessariamente têm ligação direta com os negócios da Stefanini. "Nosso sucesso com a Stefanini Ventures nos estimulou a investir em formatos diferentes. A indústria de venture capital no Brasil tem espaço para crescer, e estamos bem otimistas com o novo projeto", diz Stefanini, que busca sócios para o CVC.
Campeãs
Segundo levantamento realizado pela consultoria Sling Hub, o Magazine Luiza foi o maior comprador de startups no ano passado, com 11 aquisições, à frente da Locaweb e da Méliuz, com oito negócios cada. De 2018 para cá, a liderança fica ainda mais folgada: 24 compras, nove a mais do que a segunda colocada.
Mesmo com esse DNA comprador, o Magazine Luiza seguirá realizando aquisições por meio do próprio caixa, sem optar por um fundo para centralizar as negociações. Isso deve ocorrer, de acordo com Vanessa Rossini, gerente de relações com os investidores do Magalu, porque a ideia é buscar empresas e empreendedores que se conectem ao ecossistema e ao modelo de negócio do Magalu.
O volume de aquisições chamou a atenção do mercado nos últimos anos. Agora, com queda de 80% no valor das ações nos últimos 12 meses, os mesmos investidores cobram a varejista sobre ter exagerado.
Na divulgação de resultados do primeiro trimestre, Frederico Trajano, presidente da companhia, afirmou que o foco agora será na integração das startups já adquiridas. Mesmo assim, segundo Vanessa, a empresa vai olhar para os bons negócios que possam aparecer. "Não nos fechamos para as oportunidades."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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