Algumas alusões racistas nas narrativas foram adaptadas
© Acervo Famíliar Monteiro Lobato |
Quem nunca ouviu falar das histórias do Sítio do Pica-pau Amarelo? Personagens clássicos criados em 1931, por Monteiro Lobato, como Emília, tia Nastácia e Dona Benta... agora, muitos livros dessa coleção histórica estão tendo trechos reescritos. É que a bisneta do autor, Cleo Monteiro Lobato, identificou alusões racistas nas narrativas e decidiu adaptar o texto.
O personagem da tia Nastácia, por exemplo, passa a ter uma posição de igualdade social com Dona Benta. Ela não é mais empregada. Dona Benta deixa de ser a "sinhá", termo que remete à proprietária de uma pessoa escravizada, e passa a ser uma amiga de infância.
Cleo Monteiro Lobato traduziu para o inglês uma versão atualizada de Narizinho Arrebitado, primeira história presente no livro Reinações de Narizinho. Até o ano que vem, as outras histórias do livro também devem ser adaptadas e lançadas.
O mesmo aconteceu com alguns livros do autor britânico Roald Dahl, autor do clássico A Fantástica Fábrica de Chocolate. As referências a gênero, aparência e peso dos personagens foram apagadas ou modificadas.
Para a professora Ormezinda Maria Ribeiro, do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas da Universidade de Brasília (UnB), essas ações são uma tendência, fruto da discussão de um grupo de pessoas. Mas, para ela, a questão precisa ser mais bem debatida, já que ainda não existe consenso.
“Porque não há consenso. E uma sociedade que se pretende ser democrática não pode considerar apenas o ponto de vista de uma parcela. É preciso levar em conta que outras pessoas pensam de forma diferente. Há vários segmentos da sociedade que precisam estar no centro deste debate”.
A professora destaca ainda que é preciso, em qualquer instância, preservar o respeito às diferenças e ao ser humano. Mas alterar obras já escritas acabam por representar uma tentativa de mudar a história, o retrato de uma época. Ela acredita que levar essas obras para as salas de aula e para os centros de debate seria a solução mais coerente.
“Eu não vejo como isso pode mudar o comportamento das pessoas, simplesmente pela troca. Eu vejo como mais produtivo utilizar essas obras na forma original e pautar o debate nas salas de aula, na sociedade, nas comunidades, mostrando como a sociedade evoluiu ou precisa evoluir em relação ao respeito aos seres humanos”.
Monteiro Lobato nasceu em 1882 e foi considerado um dos maiores autores de histórias infantis do Brasil. Sua obra mais conhecida é O Sítio do Pica-pau Amarelo, composta de 23 volumes.
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